quarta-feira, 27 de julho de 2016


22 ANOS SEM TOM JOBIM

HÁ 22 ANOS, O BRASIL PERDIA UM DOS MELHORES COMPOSITORES DE SUA HISTÓRIA MUSICAL. TOM JOBIM (1927 – 1994) DEIXOU SUA MARCA REGISTRADA COMO UM DOS CRIADORES DA BOSSA NOVA E, PARA RELEMBRAR SUA CARREIRA, A REVISTA KEYBOARD BRASIL FAZ UMA JUSTA  HOMENAGEM.

* Por Heloísa Godoy Fagundes


Desde que me lembro gosto de música. Lembro-me dos meus tios tocando violão, minha avó tocando piano, meu tio-avô cantando ópera... E vinham os choros, as valsas, Bach e tudo o mais, até que me mandavam para a cama...  –  Tom Jobim
O Brasil é o país da música popular. Foi aqui que nasceram Noel Rosa, Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Chico Buarque e o maior compositor popular de um país de compositores populares – Tom Jobim. Suas composições incorporaram à música brasileira influências do Jazz americano e da música erudita, especialmente de Debussy e Villa-Lobos, com quem Jobim foi frequentemente comparado no início da carreira.

Nascido no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim é um dos nomes que melhor representam a música brasileira na segunda metade do século XX, influenciando artistas consagrados com a sensibilidade de suas letras e melodias.

Filho de pai advogado e mãe proprietária do Colégio Brasileiro de Almeida (que já não existe mais), Tom cresceu atleta, louro e queimado de sol. “Nós éramos os garotos de Copacabana e Tom Jobim o garoto de Ipanema” disse, certa vez, o saudoso letrista Ronaldo Bôscoli.

Sua habilidade musical era fruto de estudo e muito trabalho – exatamente o que diferenciava Tom da maior parte dos compositores brasileiros. Estudou piano com Lúcia Branco, uma das melhores professoras do Rio em sua época, a mesma que deu aula para concertistas como Arthur Moreira Lima. Lapidou seus conhecimentos de música clássica com o alemão Hans-Joachim Koellreutter, o mestre de nove entre dez compositores eruditos brasileiros dos anos 50 em diante. Por isso, Tom era um dos poucos em sua profissão capazes de escrever seus próprios arranjos. Começou sua carreira, por assim dizer, já pronto, aos 29 anos.

O Início...
Tom ouvia Jazz no rádio nos anos 50 como todo mundo, mas não era seu tipo de música predileta. Preferia os standards da orquestra de Glenn Miller às experimentações de Charlie Parker. Suas influências, segundo ele próprio, eram Debussy, Villa-Lobos, Stravinsky e Chopin. Não é difícil comprovar que Tom dizia a verdade. Basta notar que uma de suas composições mais famosas, Insensatez, é incrivelmente parecida com o Prelúdio em Mi Menor, Opus 28, de Chopin, a ponto de ser possível tocar uma música com o acompanhamento da outra.

O próprio Tom gostava de dizer que a inspiração para Samba de uma Nota Só não era o famoso ostinato de Night and Day, mas outro prelúdio de Chopin, conhecido como Prelúdio da Gota d'Água. Seus acordes sobrepostos vêm de Debussy que, assim como Chopin, brincava com acordes dissonantes numa época em que o jazz nem sonhava existir.

Trajetória...
Tom cursou apenas o primeiro ano de Arquitetura. No início, Tom foi parceiro de Alcides Fernandes, marido de sua lavadeira, em cinco músicas que ninguém quis gravar. Das primeiras gravadas, Pensando em Você (letra e música) e Incerteza (letra de Newton Mendonça, de quem seria parceiro por muitos anos), não existem vestígios. Tom não tinha o disco de 78 rotações nem sabia quem pudesse ter um. Data talvez daí a insistência do futuro maestro em escrever suas partituras. 

“Bach, Mozart, Beethoven, qualquer compositor, grande ou pequeno, não existiria se não houvesse escritura musical”, dizia Tom Jobim.
Já casado com sua primeira esposa, Teresa Hermanny, para pagar o aluguel passou a tocar em inferninhos na noite carioca (Mocambo, Clube da Chave, Acapulco, Farolito, Vogue e Far-West). De dia, dava expediente no estúdio da gravadora Continental. Ali usava o que aprendeu com o maestro Radamés Gnatalli, fazendo arranjos para cantores de vozeirões impressionantes, como Dalva de Oliveira e Vicente Celestino, e também para os de estilo bem mais cool, como Dick Farney e Elisete Cardoso.

Sua primeira música gravada foi Incerteza, em 1953, parceria com Newton Mendonça (com quem mais tarde comporia O Desafinado). Mas, o primeiro sucesso só aconteceu no ano seguinte, com Tereza da Praia, parceria com Billy Blanco, interpretada em dueto por Dick Farney e Lúcio Alves.

Em 1956, Jobim musicou a peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes, trabalho que inaugurou uma das mais férteis parcerias da música brasileira. O sucesso Se Todos Fossem Iguais a Você é dessa peça.

Em 1958, o compositor gravou o disco considerado o marco inicial da Bossa Nova, Canção do Amor Demais, com a cantora Elizeth Cardoso. Nesse disco, em que João Gilberto aparece apenas como violonista em algumas faixas, surgem já as primeiras harmonias e orquestrações mais tarde consagradas pelo gênero que se tornou sinônimo de Brasil no exterior.

[...] sou um infeliz paralisado num quarto de hotel, esperando o chamado para a gravação, naquela astenia física que precede os grandes acontecimentos, vendo televisão sem parar e cheio de barrigões.  –  Em uma das cartas escritas por Tom ao amigo Vínicius, onde assinou Astênio Claustro Fobim, enquanto esperava a gravação do CD com Frank Sinatra em Los Angeles.
Apesar de grande cantora, Elizeth estava ainda demasiadamente presa à tradição interpretativa derramada do samba-canção para levar a cabo as inovações que a Bossa Nova exigia.

Ainda no ano de 1958, é relançada em compacto a faixa Chega de Saudade (composta juntamente com Vinícius de Moraes), e Canção do Amor Demais, em gravação de João Gilberto, com sua voz contida e violão sincopado. E é nessa gravação que se pode ouvir a Bossa Nova já em plena forma.

Em 1959, foi a vez de Sílvia Telles gravar Amor de Gente Moça, um disco com 12 músicas de Tom, entre elas Só em Teus Braços, Dindi (com Aloysio de Oliveira) e A Felicidade (com Vinicius).

Em 1962, Tom Jobim fez sua primeira viagem aos EUA para apresentar um espetáculo de Bossa Nova no Carnegie Hall, em Nova York. O show causou grande comoção entre músicos americanos, que se apressaram a aderir ao movimento.


Abaixo: Vinícius de Moraes e Helô Pinheiro, a garota de Ipanema.
Oitenta por cento do meu trabalho não tem nada a ver com Bossa Nova. Posso dizer que dediquei minha vida ao samba de preto. ”  –  Tom Jobim
Entre 1962 e 1963, a quantidade de clássicos produzidos por Tom foi impressionante: Samba do Avião, Só Danço Samba e Ela É Carioca  (com Vinícius), O Morro Não Tem Vez, Inútil Paisagem (com Aloysio) e Vivo Sonhando.

Com Vinícius compôs, em 1963, um de seus maiores sucessos e possivelmente a música brasileira mais executada no exterior: Garota de Ipanema.

O sucesso de suas músicas fora do Brasil o fez voltar aos EUA onde gravou discos (o primeiro individual foi The Composer Of 'Desafinado' Plays, de 1965), participou de shows e fundou sua própria editora, a Corcovado Music.

                Tom Jobim em sua casa da Rua Barão da Torre, em Ipanema, 1960.

Nos anos seguintes, figurões como Frank Sinatra, Quincy Jones, Stan Getz, Cannonball Adderley, Dave Brubeck, Paul Desmond e até Elvis Presley se aventuraram com graus de sucesso variáveis no terreno do Brazilian Jazz, nome pelo qual o gênero que Tom ajudou a inventar se tornou conhecido nos EUA.

Com Frank Sinatra, Tom gravou o disco Francis Albert Sinatra e Antônio Carlos Jobim, em 1967, com arranjos de Claus Ogerman, incluiu versões em inglês de músicas de Tom (The Girl From Ipanema, How Insensitive, Dindi, Quiet Night of Quiet Stars) e composições americanas, como I Concentrate On You, de Cole Porter. Foi o segundo disco mais vendido nesse ano nos EUA, onde o carioca chegou a ser chamado de Gershwin brasileiro.

No fim dos anos 60, depois de lançar o disco Wave (com a faixa-título, Triste, Lamento e várias músicas instrumentais), participou de festivais no Brasil ganhando, inclusive, o primeiro lugar no III Festival Internacional da Canção da TV Globo com Sabiá, parceria com Chico Buarque, interpretado por Cynara e Cybele, do Quarteto em Cy.

Durante a década de 70, a música de Tom passou a refletir uma maior influência de compositores clássicos, especialmente Villa-Lobos, em composições instrumentais de discos como Matita Perê e Urubu, que marcam a aliança entre a sofisticação harmônica de Tom e sua qualidade de letrista. São desses dois discos Águas de Março, Luíza, Lígia, Correnteza, O Boto e Ângela.

Mas a canção popular continuou sendo de importância central na obra do compositor que, na mesma época, gravou ótimos discos em parceria com grandes cantoras como Elis Regina e Miúcha.

Em 1986, Tom oficializou seu segundo casamento com Ana Beatriz Lontra. Em 1987, o compositor lançou Passarim trazendo, além da faixa-título, a melancólica Anos Dourados, que entrou na trilha do seriado homônimo da Globo e a trilha da versão cinematográfica do romance Gabriela, de Jorge Amado.


Em 1992, Tom foi tema do desfile da escola de samba Mangueira. A música que compôs em homenagem à escola foi Piano na Mangueira (com letra de Chico Buarque), também incluída no repertório de Antônio Brasileiro, seu último disco, lançado em 1994 e que conta, também, com a participação do cantor inglês Sting na regravação de Insensatez.

Ainda em 1994, Tom voltou ao Carnegie Hall, dessa vez para promover a Rainforest Foundation, ao lado de Sting, Elton John e Luciano Pavarotti.



Tom Jobim morreu no dia 8 de dezembro de 1994, aos 67 anos, em Nova York, durante uma angioplastia. Seu corpo foi enterrado no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. Deixou quatro filhos.

A qualidade e a sofisticação musical estampadas em suas canções ainda seduzem e fascinam ouvintes de todo o mundo porque ... o resto é mar, é tudo o que não sei contar...















SAIBA MAIS SOBRE TOM JOBIM:
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* Heloísa Godoy Fagundes é pesquisadora, ghost writer e esportista. Amante da boa música, está há 10 anos no mercado musical de revistas. Já trabalhou na extinta Revista Weril e atualmente é publisher e uma das idealizadoras da Revista Keyboard Brasil.










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