segunda-feira, 24 de outubro de 2016

NACIONALISMO NA  MÚSICA ERUDITA PARTE FINAL
O Gigante Heitor Villa-Lobos

O MAESTRO HEITOR VILLA-LOBOS DESTACA-SE POR TER SIDO O PRINCIPAL RESPONSÁVEL PELA DESCOBERTA DE UMA LINGUAGEM PECULIARMENTE BRASILEIRA EM MÚSICA. COMPUNHA OBRAS QUE ENALTECIAM O ESPÍRITO NACIONALISTA, INCORPORANDO ELEMENTOS DAS CANÇÕES FOLCLÓRICAS, POPULARES E INDÍGENAS.

 * Por Sergio Ferraz

Sobre Heitor Villa-Lobos (1887-1959), poderíamos escrever inúmeras páginas, ensaios acadêmicos, uma boa quantidade de livros e ainda assim o assunto não seria esgotado. Sem dúvida, Villa-Lobos foi o maior fenômeno ocorrido na música erudita brasileira do século XX. Ele figura em grau de importância e grandeza a compositores como Debussy e Stravinsky. Com relação a seus predecessores brasileiros, enquanto estes estavam mais ligados a influencia de Wagner, Brahms, da Escola Russa e do romantismo, Villa-Lobos estava mais conectado a música da virada do século XIX e início do século XX, como o impressionismo de Debussy.

Também o tratamento que Villa-Lobos deu aos elementos de origem folclórica e popular difere bastante das gerações anteriores. Esses elementos são tratados de forma mais completa e livre, sendo assim um elemento assimilado ao seu estilo pessoal de compor, e não uma simples citação para conferir um colorido exótico à composição.
"O compositor genuíno, por mais cosmopolita que seja, é mais do que nada a expressão de um povo, de um ambiente (... ) E é da força da terra, da raça, do sentimento popular, do meio ambiente que deve brotar uma arte genuína e vital." - Villa-Lobos

Sobre isso, o músico José Maria Neves em seu livro Música Contemporânea Brasileira, diz o seguinte: “Mais do que seus predecessores, Villa-Lobos verá o folclore e a tradição popular como um todo, como um amálgama complexo do qual não se pode isolar este ou aquele elemento. Por isso mesmo, sua música não se prenderá às características negras ou indígenas, mas procurará refletir um clima sonoro que, como já disseram muitos autores, mostra mais a terra do que a raça.”

As obras escritas a partir de 1917, como os Quartetos no. 3 e 4, os poemas sinfônicos Iara e Saci Pererê, e principalmente o balé Amazonas , inauguram uma nova fase estética, com notável enriquecimento de recursos técnicos e de um espírito essencialmente nacionalista. Porém esse nacionalismo villalobiano nada tem a ver com aquele nacionalismo impregnado do espírito romântico e ingênuo. O nacionalismo de Villa-Lobos é pleno de um primitivismo violento, rude e direto, como a natureza tropical.

É a partir do balé Amazonas que o nacionalismo ganha contornos claros e definitivos nas composições de Villa-Lobos. Um nacionalismo completamente pessoal, rico em texturas cores e sons, sendo também natural, vindo direto do espírito do compositor que soube como ninguém captar a alma da terra do povo e da natureza do Brasil. Destacamos também o balé Uirapuru, a Fantasia em Movimentos Mistos, os Quartetos de Cordas, a incrível série de Choros entre muitas outras.

Música  para  piano  solo...


Villa-Lobos escreveu música para todos os tipos de instrumentação, de peças para instrumentos solo, música de câmara, música vocal e sinfônica, sempre de forma genial. Não poderia deixar de mencionar as composições de Villa-Lobos para piano solo, onde vemos uma incrível vitalidade rítmica, como na série Ciclo Brasileiro, Danças Características Africanas, outras com forte caráter impressionista onde se vê o uso de superposição de tons, utilização de blocos sonoros não explicáveis funcionalmente como a Suíte Floral, bem como singelas peças com temas extraídos de cantigas de roda como na série Brinquedos de Roda e também a suíte para piano A Prole do Bebê , composta em 1918 e tocada pela primeira vez por Athur Rubenstein, em julho de 1922.

É claro que o assunto do nacionalismo na música erudita brasileira não encerra-se em Heitor Villa-Lobos. Ao contrário, Villa-Lobos foi um divisor de águas na história da música erudita brasileira, ao mesmo tempo que representa também o impulso para as gerações seguintes. Ele foi o compositor símbolo do movimento modernista liderado pelo escritor, pesquisador e mentor intelectual do movimento modernista e da Semana da Arte Moderna de 1922, Mário de Andrade. Um dos motivos para isso foi sua maturidade musical que sintetizava de forma grandiosa e original uma música que representava o espírito e a alma da terra e do povo brasileiro. 


A tendência nacionalista de uma forma ou de outra esteve presente nas gerações pós Villa-Lobos, independentemente de qual seja a escola, como aqueles da Música Viva com tendência ao atonalismo, ou mais adiante o surgimento de movimentos de caráter mais regionalista como o Movimento Armorial,  liderado pelo escritor Ariano Suassuna. O fato é que, em um país de dimensão e vasta diversidade cultural como o Brasil, a abundância de material rítmico e melódico de fontes folclórica e popular são praticamente inesgotáveis, tornando-se um atrativo valioso para a composição musical e possibilitando a abertura de ricas e criativas ideias musicais. 

Bibliografia pesquisada e indicada:
GROUT & PALISCA. História da Música Ocidental.
GRIFFITHS, PAUL. A Música Moderna. 

NEVES, JOSÉ MARIA. Música Contemporânea Brasileira. 

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* Sergio Ferraz é violinista, tecladista e compositor. Bacharel em música pela UFPE, possui seis discos lançados até o momento. Também se dedica a composição de músicas Eletroacústica, Concreta e peças para orquestra, além de ser colunista da Revista Keyboard Brasil.



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